Consciência Negra

Câmara de Lauro de Freitas proíbe feriado da Consciência Negra

Câmara Municipal dos Vereadores de Lauro de Freitas/Ba altera Lei Orgânica Municipal para revogar o feriado de 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.

Além das questões que envolvem Zumbi e o Quilombo dos Palmares, o Dia da Consciência Negra é uma data significativa, pois traz luz à questão que vai além do mero simbologismo e que, infelizmente, faz parte do cotidiano das pessoas, a saber, a desigualdade da sociedade brasileira, que tem no racismo seu elemento estruturante.

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Para além de meia dúzia de pessoas da elite endinheirada do setor empresarial de Lauro City, que entende como prejuízo econômico o referido feriado (porque ou concede folga ou paga 100% de hora extra ao trabalhador), a “Casa do Povo” não atende ao interesse do povo quando promove tal alteração na Lei Orgânica.

Fazendo parte da RMS, região mais negra fora da África, o feriado da consciência negra em Lauro de Freitas nada mais é do que a mistura de dois sentimentos:

1. Comemoração e reafirmação daquilo que somos, uma cidade negra.

2. Sentimento de alerta para o fato de que precisamos avançar, isto é, vencer etapas, sair da fase do “eu sou negão”, como na letra de Gerônimo nos anos 80; e partir para a fase da insurgência, “…eu sei o que é bom/e o que é bom também deve ser meu…”, como nos versos da música 14 de maio , letra de Jorge Portugal, melodia de Lazzo Matumbi, já em 2016.

O Dia da Consciência Negra é importante para relembrarmos que a nossa sociedade foi construída por meio da escravidão.

Nesse sentido, importante trazer à baila a discussão trazida pelo sociólogo Jessé Souza no livro A ELITE DO ATRASO, 2017, que coloca em destaque a seguinte problematização: A escravidão (e não a corrupção) é o que define a sociedade brasileira hoje.

A ‘ralé de novos escravos, mais de um terço da população, é explorada pela classe média e pela elite…, diz Souza.

O autor define de maneira “provocativa” como ralé o percentual da população que seria uma continuação direta dos escravos. “Ela é hoje em grande parte mestiça, mas não deixa de ser destinatária da superexploração, do ódio e do desprezo que se reservavam ao escravo negro. O assassinato indiscriminado de pobres é atualmente uma política pública informal de todas as grandes cidades brasileiras.”

A elite econômica seria nesse caso, conforme assinala Jessé Souza, “… uma continuidade perfeita da elite escravagista”, que continua condenando “os de baixo” à reprodução de sua miséria enquanto o baronato de hoje amplia o próprio “capital social e cultural”.

Por mais que melhorias e mudanças tenham acontecido, a falta de oportunidades para a população negra, o racismo presente nos detalhes do cotidiano e as tentativas de apagamento da cultura africana evidenciam que ainda temos um longo caminho a ser trilhado. É DISSO QUE SE TRATA O DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA.

Já sendo inaceitável não ter na capital baiana o 20 de novembro como feriado, a cidade mais negra fora da África, inclusive o próprio planeta não entende tamanha resistência ao um processo que deveria ser natural, ou seja, nada além do racismo à brasileira pra explicar tal fenômeno.

É inadmissível o presente retrocesso na cidade de Lauro de Freitas, que compõe a Grande Salvador.

A Câmara Municipal de Lauro de Freitas, a nossa casa, a Casa do Povo, dá um passo gigantesco de marcha ré na sua própria história.

Em nome do interesse do grande empresariado local, atendendo ao lóbi promovido por esse setor, a Casa Legislativa Municipal revoga um direito que é fruto da luta da nossa gente, obrigando o movimento negro e popular da cidade a voltar lutar batalhas que já tinham sido vencidas, quando agora as lutas já seriam outras.

Todo o repúdio à revogação do feriado do 20 de novembro em Lauro de Freitas. Nenhum direito a menos a quem, sobretudo para aqueles cujo o direito assiste tão pouco.

Por Júnior Gonçalves