Mulher rouba todo o dinheiro da companheira

Mulher rouba todo o dinheiro da companheira: Bruna Rigo, de 30 anos, descobriu que a mulher com quem se relacionava tinha vasto histórico de golpes em várias cidades do Brasil, e que mentiu sobre quase tudo no relacionamento entre as duas

Bruna Rigo, de 30 anos, trabalhou por seis anos em uma multinacional e, no fim desse período, decidiu pedir demissão para trabalhar como videomaker e, em especial, manter uma vida de viagens pelo Brasil. Com o dinheiro da rescisão no bolso, ela começou a “migrar” para a nova profissão e se jogou na estrada em julho de 2019.

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A mulher, que morava em Goiânia, em Goiás, partiu, primeiro, para Guarapari, no Espírito Santo. Logo na primeira parada, ela se instalou em um hostel na cidade e, para pagar as contas, trabalhou no lugar por algum tempo.

Lá, ela conheceu Bia – apelido de Fabíola Nolasco –, que tinha 38 anos, e morava no local. A afinidade entre as duas – de Milton Nascimento, ao gosto pela vida de viajante – não demorou para se transformar em um romance, que, anos depois, se mostraria uma tragédia.

“Ela contava que era chefe de cozinha na Itália, que tinha ido para o país com 20 anos, e que, desde então, morava lá. Ela estava só viajando (para o Brasil), como se fosse um ano sabático. Dormíamos no mesmo quarto, coletivo, com sete camas, com outros voluntários e hóspedes. Começamos como amigas, íamos à praia juntas. Ela tem essa característica, bem encantadora, de fazer você se sentir confortável. Bia é uma ótima cozinheira, se mostrava uma pessoa generosa. Não gostava de cobrar as pessoas. Bem generosa”, conta Bruna.

Bia narrava que nasceu em Vila Velha, região metropolitana de Vitória, também no Espírito Santo. Aos 19 anos, próximo ao aniversário dela, ela contou que tinha uma viagem planejada com os pais – com quem tinha uma relação difícil – para o Rio de Janeiro.

À época, ela estava brigada com a mãe e teve “um pressentimento” antes do embarque. Ainda assim a viagem aconteceu, e, à noite, durante forte chuva, o motorista de um caminhão perdeu o controle e atingiu o carro em que a família estava. Os pais de Bia morreram no local, e ela ficou por três meses em coma em um hospital.

Os avós de Bia já haviam falecido. Tanto o pai quanto a mãe eram filhos únicos e ela não tinha irmãos. A única pessoa com quem tinha contato era a madrinha, que era italiana. Bruna lembra que a ex-namorada disse que havia se mudado para o país após o acidente, para que fosse “cuidada” pela mulher.

Em solo europeu, trabalhou em restaurantes e estudou gastronomia em Milão. Ainda na Itália, Bia conheceu Lítia, uma mulher 13 anos mais velha do que ela na época, com quem manteve um relacionamento de oito anos.

“Vulnerável, sozinha. (Bia contava que) tinha que lavar louça (na casa da madrinha), sendo que a família era de classe média alta. O pai dela trabalhava com política, na prefeitura. A mãe era médica pediatra. Eles tinham muitos bens, cofres com joias em casa. Quando Bia questionava a madrinha sobre dinheiro, ela respondia que gastou toda a herança com a recuperação de Bia após o acidente”, continua Bruna.

Antes de viajar ao Brasil, duas outras tragédias ocorreram na vida da mulher – a madrinha, dizia, estava aproveitando da fortuna dos pais. Lítia, a namorada, a estava traindo, e, Bia, viu a cena do adultério.

“Nunca tinha sentido tanta empatia por alguém. Foi passando os dias e, em algum momento, me senti atraída e fui falar com ela. Se ela fez eu me apaixonar, eu não sei, mas fui eu quem dei o primeiro passo. Minha mãe foi para Guarapari passar uns dias, contei para ela. Contei que estávamos juntas. Nesse meio tempo, a Bia estava com passagem comprada para o começo de setembro para voltar para a Itália. Só que ela não ia voltar sozinha, ia voltar com uma menina chamada Camila, que é de BH, que era voluntária no hostel. A Bia ia ajudar a Camila na Itália. Estava tudo certo, ela tinha dado os documentos, eu sabia que ela ia voltar para a Itália e tudo bem. Fomos nos envolvendo mais, e, em determinado momento, ela desistiu de ir para a Itália e quis ficar no Brasil para viajar comigo”, narra Bruna.

As duas seguiram viagem para a Bahia. Bia dizia que, quando voltou ao Brasil pela primeira vez após o período em Milão, havia morado em Salvador – cidade onde era conhecida como “Mel”. A afirmação era sustentada por uma nota de jornal, na qual ela aparecia cozinhando uma lagosta no Senac da cidade, instituição na qual teria estudado cozinha brasileira e afro-brasileira.

“A relação ficava cada vez mais séria. Nunca conheci nenhum amigo dela anterior a mim. Ela falava dos amigos, mas nunca conheci pessoalmente. Pensava que a maior parte estava na Itália, então estaria tudo bem. Continuamos viajando, fazendo trabalhos voluntários. Ela dizia que tinha casa na Itália, em Bergamo, na Lombardia. Achei um perfil de Facebook antigo dela. Era meio desativado, mas fiquei tranquila: ‘Ela existe,’ pensei”, segue.

A relação entre as duas se aproximava de três anos, quando começou a pandemia de Covid-19 no Brasil. As duas continuaram morando em Guarapari por um tempo, alugaram uma casa – no nome de Bruna. Tudo, sempre, era registrado no nome de Bruna. “Hoje, vejo como um aviso, mas na época nem cogitei nada”, desabafa. As duas partiram em viagem pouco depois, até Cumuruxatiba, cidade no extremo-sul do litoral baiano, em junho de 2021.

Havia outra personagem na vida de Bia – a advogada Cheila, com quem ela afirmava conversar diariamente, pelo Facebook. Era a melhor amiga da mulher, mas ela nunca a tinha apresentado à namorada. A advogada tinha duas casas. Uma em Paraty, no Rio de Janeiro, e outra em Roma, na Itália.

“Bia a considerava como uma irmã mais velha. A Cheila tinha uma procuração no nome dela para caso acontecesse alguma coisa aqui no Brasil. Ela falava que todo dia mandam um oi para a outra, para garantir que estavam bem. Se um dia ela morresse, ninguém sentiria a falta dela – a não ser Cheila. Mas ela começou a inventar que Cheila tinha ciúmes de mim. Nem tinha vontade de conhecê-la. Um mês atrás, ela falou que Cheila estava com Covid-19. Uma semana depois, disse que Cheila estava em coma”, lembra Bruna.

Bia fez um escarcéu com a situação. Diariamente, repetia à namorada que tinha medo de que a amiga morresse. No 10 de agosto deste ano, ela afirmou à Bruna que Cheila morreu por complicações da doença. Bia acordou a companheira às 4h30 da madrugada daquele dia, informando que iria até Prado, cidade que fica próxima a Camuruxatiba, que tinha um cartório, para resolver trâmites legais envolvendo o falecimento da amiga. Ela partiu às 6h, no primeiro ônibus que fazia o trajeto.

“A gente só tinha um celular. O dela havia estragado. Meu e-mail, meu Facebook, tudo, estava salvo nele. Ela falou que ia levar o celular para se comunicar comigo. Fiquei com o computador. Ela mandava mensagem durante o dia. Disse que não conseguiu resolver, e ia dormir lá. Havia uma pousada que sempre ficávamos, mas ela não quis ficar lá. Ficou em uma mais barata. No dia seguinte, repetiu que não havia terminado os trâmites. No próximo, disse que precisava ir a outro lugar. Bia era tão ardilosa que eu estava com a pulga atrás da orelha, pensava que havia algo errado, mas olhava o histórico do iPhone, e ela tinha pesquisado coisas coerentes com o que dizia”, lembra.

Decepção

No quarto dia, Bia sumiu. E não voltou – era uma quinta-feira. Na sexta, Bruna foi até a cidade, preocupada com a companheira. A mulher andou pelas ruas de Prado com uma foto da namorada, perguntando sobre ela em comércios, pousadas, hospitais, delegacias, rodoviárias. Ninguém sabia do paradeiro. No cartório em que a mulher havia afirmado que estava resolvendo questões relativas à morte de Cheila, Bia nunca tinha pisado.

“Falei com meu pai e disse: ‘acho que ela foi embora e roubou a gente’. Meu pai disse: ‘Bruna, pelo amor de deus, quando ela aparecer não fale isso. Imagina o quanto ela vai ficar chateada se a gente pensar isso dela’. Tive que comprar um celular, comprei chip, voltei para casa, conectei na internet e vi a minha conta bancária. Estava zerada. Estava investindo, tinha o valor de rescisão. Fiquei um ano com o valor na minha conta. Meu pai vendeu o caminhão que usava para trabalhar e tinha pedido para depositar na minha conta. Não tinha nada”, lamenta.

O golpe foi ainda maior – Bia havia feito empréstimos em três bancos no nome de Bruna. O nome da videomaker estava sujo e, com o tempo, ela descobriu que a namorada tinha vários processos por cheque sem fundo aplicados como se fossem no nome dela. Quando conseguiu ver a última localização registrada pelo celular que estava em posse de Bia, a mulher estavano Rio de Janeiro.

“A gente vai descobrindo cada vez mais coisas. Vi que ela era foragida, tinha dado golpes em Paraty. Não consigo contato com ela. Estou tentando falar com outras pessoas que sofreram esse golpe”, narra. Cheila, a amiga que Bia afirmara que havia morrido, estava viva. Bruna entrou em contato com ela pelo Facebook pouco depois de a mulher ter sumido. Ela respondeu: “ela é perigosa. É foragida, aplicou golpes em várias pessoas, em duas ex-namoradas”.

“Tudo que ela falou, se foi uma grande mentira… o comportamento dela, ela sempre foi muito entregue, muito honesta. Todos acreditaram. Aquela frase de rap, ‘[quem] é de verdade sabe quem é de mentira’. A gente sente quem é uma pessoa ruim, maldosa, e, com ela, não senti. Todo mundo que conheço está desacreditado. Vários amigos meus disseram que passaram mal de ouvir. É bizarro demais”, continua a vítima.

“Eu não consigo sentir raiva dela. Lógico que ela me lesou de todas as formas, mas, enquanto a gente estava junta, eu fui feliz. Ela era maravilhosa. Eu gostava muito da relação com ela, era leve, confortável, sempre teve muito cuidado comigo. Nesses dois anos, quase três, eu não sofri com ela. Não consigo ter raiva, nem tristeza, saudade. Eu sinto muita pena. De coração”, conclui.

A reportagem teve acesso ao boletim de ocorrência registrado por Bruna Rigo contra a ex-namorada, além de imagens e mensagens que mostram a vida pregressa das duas, e o período em que o golpe ocorreu.

As Polícias Civis da Bahia e do Rio de Janeiro foram procuradas, mas não conseguiram encontrar registros de práticas criminosas com as informações dadas pela mulher à ex-companheira. Pelas redes sociais, quando Bruna compartilhou o relato, várias pessoas afirmaram conhecer a mulher – com nomes diversos, e histórias parecidas às narradas por ela. Não se sabe, por ora, o paradeiro da suspeita.

Além disso, várias das mentiras contadas por Bia caíram por terra. Bruna chegou a descobrir que o pai dela não havia morrido em um acidente de carro, mas sofrera um infarto. Ela também não era filha única – tem três irmãos por parte de pai, que moram em Itiruçu, no interior da Bahia. Ao entrar em contato com a família da ex, Bruna descobriu que eles não conheciam a irmã pessoalmente, apesar de saberem de sua existência. A vítima não conseguiu localizar a mãe de Bia.

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